quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Sobre democracia partidária e cupulismo

Os principais jornais do país estamparam nas últimas 24 horas a formação de uma federação partidária incluindo os seguintes partidos: PV, PSB, PCdoB e PT.

A notícia do Correio Braziliense traz os seguintes dizeres: "Os presidentes regionais do Partido Verde aprovaram a criação federação com o PSB, PCdoB e PT em reunião com presidentes estaduais da legenda, nesta terça-feira (21/12). Também foi aprovado o apoio à candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula (PT) à Presidência da República." *  

Como membro do Diretório Nacional do Partido Verde e da Executiva do PV-MG e, sobretudo, como politólogo, causa-me estranheza tomar conhecimento de tão importante decisão apenas pela imprensa. A bem da verdade, tem se ventilado há algumas semanas a criação dessa federação partidária. Todavia, não houve, durante o processo deliberativo, qualquer escuta formal ao diretório nacional, tampouco aconteceram debates consistentes para se discutir as teses e bases para a criação dessa federação. Pode-se tomar tão impactante decisão sem se ouvir as bases partidárias?

Até aqui, por tudo o que vi e acompanhei do processo deliberativo sobre a formação da federação, parece-me que aguarda-se dos membros do partido tão somente um referendo acrítico.  A democratização partidária, no entanto, deve exigir, no mínimo, um modelo plebiscitário. Neste sentido, causa-me grande preocupação a verticalização das decisões do partido e a nulidade dos debates internos.

O Diretório Nacional, a meu ver, tem funcionado unicamente como uma mera instância que respalda o processo decisório da cúpula, sem dela participar. Esse desenho institucional não contribui em nada para o crescimento orgânico do partido.  


Annalene Baerbock, líder do Partido Verde alemão apresenta
Programa de Governo. Março de 2021. Photo by Sean Gallup/Getty Images


Minha posição (exclusivamente pessoal enquanto membro do Diretório Nacional do PV) é de que precisaríamos de instâncias horizontalizadas de deliberação - o DN poderia e deveria cumprir esse papel. Em meio a tanta tecnologia, por que não implementar um robusto instrumento de participação e deliberação interna?  Os novos tempos estão a exigir isso dos partidos. É preciso não ignorar esses sinais. Senão, como falaremos de democracia em nossos programas, carta de princípios e nos manifestos, se sequer  a praticarmos internamente?

Não foi por acaso que o sistema partidário brasileiro colapsou e possibilitou o surgimento do Bolsonarismo. Os partidos, sobretudo os de matizes ecológicos, precisariam aprender com todo esse processo e melhorar a sua governança e mecanismos internos de transparência, participação e deliberação. Mas não é o que temos acompanhado. Infelizmente. A maioria de nós toma conhecimento apenas pela imprensa o que se deveria publicizar após amplo debate interno.   

A pergunta incômoda que faço é: os dirigentes partidários querem mesmo um partido político democrático ou se aterão eternamente aos anacrônicos modelos baseados no cupulismo?   

Era o momento de discutirmos as estratégias dos verdes brasileiros diante de um cenário em que  a ecologia política tem conquistado cada vez mais corações e mentes pelo mundo. O bonde da história está passando, nossas narrativas históricas estão sendo apropriadas e estamos nos apequenando.  

Recuso-me a entrar no mérito da criação da federação. Não é sobre isso que estou escrevendo. É sobre a necessidade de se pensar sobre participação, governança democrática e princípios numa agremiação partidária. 

É como diz aquele velho provérbio: “A palavra inspira, mas o exemplo arrasta”. Definitivamente, precisamos da práxis democrática, para além das meras palavras que inspiram, estas aliás estão fartamente descritas em nossos documentos fundacionais.



Alisson Diego Batista Moraes
Secretário de Mobilização do PV/MG 
Membro do Diretório Nacional do PV


* https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/12/4972570-partido-verde-apoia-lula-e-aprova-federacao-com-pt-psb-e-pcdob.html

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