Afora o exagero e a retórica publicitária (típicos de grande parte dos palestrantes e elementos presentes em diversos momentos no artigo referenciado), a argumentação de Weiner faz algum sentido porque o fato é que não houve um ser humano sequer que não tenha sido afetado de algum modo pelos efeitos psíquicos, econômicos, sociais ou mesmo físicos advindos destes tempos pandêmicos.
Entretanto, não é qualquer filosofia que deve ser evocada nestes tempos, de acordo com o escritor estadunidense. São os antigos gregos e os existencialistas franceses os possuidores da chave da sabedoria filosófica capaz de abrir nossas mentes fechadas e doentias nestes tempos obnubilados e promover uma “cura lenta”. É a filosofia compreendida como “medicina prática e terapêutica para a alma”. Ou seja, o autor está se referindo ao estoicismo e ao existencialismo - duas das mais conhecidas “correntes filosóficas”, distantes temporalmente e conceitualmente, mas unidas, oportunisticamente, pelo jornalista.
Sou tomado de um juízo radicalmente crítico quando assisto aos aproveitadores que tentam amoldar o saber filosófico na vala rasa da auto-ajuda ou nos potes diminutos fabricados pelos parlapatões da “onda coach” (ou seria um tsunami?), mas sou igualmente crítico quando os acadêmicos insistem em isolar a filosofia do povo, das ruas e da realidade, adornando-a com uma aura de transcendentalismo e inalcançabilidade. Se o saber filosófico não é algo simplista (e, de fato, não é mesmo), também não pode ser algo apenas adstrito aos muros da academia. A filosofia, como ensinou muito bem Sócrates, pode e deve ser feita a partir das ruas, vencendo os mitos com o exercício da capacidade crítica – questionarmos nós mesmos e também questionarmos o mundo e a sociedade.
O artigo do Weiner contém algumas inconsistências relevantes, mas reconheço que possui o mérito de tentar (assim como Mário Sérgio Cortella, Karnal, Pondé e outros tantos o fazem) trazer as reflexões (filosóficas ou não) para perto do povo. Isso, seguramente, é muito melhor do que nos acostumarmos à passividade e ao conformismo acrítico. Se obras como a de Weiner ou de Pondé ao menos instigarem a curiosidade intelectual ou existencial já terão cumprido um bom papel. Ao curioso leitor, caberá decidir se aprofundará na busca pelo libertador conhecimento filosófico ou se deixará agrilhoar pelas amarras sociais e culturais tão confortáveis quanto ilusórias.
Compartilho um trecho do mencionado artigo que, embora simplista, estimula-nos a refletir sobre o papel da filosofia nos dias de hoje: “A filosofia nos ajuda a desembaraçar as complicadas questões éticas levantadas pela pandemia, mas também pode nos ajudar a responder dilemas muito mais pessoais, mas igualmente urgentes: Como suportar o insuportável? Como encontrar certeza em um universo incerto? A filosofia não oferece respostas fáceis, mas reformula nossas perguntas e altera nossas perspectivas - uma habilidade que é útil durante os bons tempos e inestimável nos tempos ruins”.
Se é verdade que a filosofia nasce do espanto, como argumentou Aristóteles, a Covid-19 pode, ao nos espantar a todos, ter acendido alguma centelha de instigação filosófica em muitas pessoas. Não deixe essa centelha se apagar. Nutra-a com estudos e reflexões.
PS: Se você, estimado(a) leitor(a), se interessar em adentar no universo filosófico, não sugiro que leia Weiner, mas sim um livro que há muitos anos entusiasma estudantes de todo o mundo e pode ser encontrado facilmente em qualquer livraria ou mesmo em nossa Biblioteca Pública Guimarães Rosa. O livro se chama “O Mundo de Sofia” e o autor é o Jostein Gaarder. Não importa a sua idade, nível de instrução, ocupação profissional ou posição social, se você quer ser instigado(a) pela filosofia, leia este livro!
* Alisson Diego Batista Moraes, 35, bacharel em Filosofia (UFMG), advogado (UIT), MBA em Gestão Empresarial (FGV) e mestrando em Ciências Sociais (PUC Minas). Artigo escrito para a edição de janeiro de 2021 do Jornal Cidades, Itaguara/MG.
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