segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

3ª Jornada Pedagógica em Ouro Preto

 A seguir, notícia compartilhada do site oficial da Prefeitura de Ouro Preto:


Ano letivo inicia com a 3ª Jornada Pedagógica, em Ouro Preto






Fonte: https://www.ouropreto.mg.gov.br/noticia/4577 // Assessoria de Comunicado da Prefeitura de Ouro Preto.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

Encantamento e ressignificação: reflexões sobre os primeiros dias de governo

Os primeiros dias de um mandato têm uma energia singular, marcada por um deslumbramento que desafia até Freud. Líderes carregam o brilho da vitória, equipes estão motivadas, e a população deposita esperanças em um governo que promete transformar a realidade. É um período onde tudo parece possível, uma fase que muitos chamam de "lua de mel". Nesse momento, Executivo e Legislativo costumam estar alinhados, pesquisas refletem alta aprovação, e o otimismo prevalece. Contudo, como toda lua de mel, essa também tem um fim. A realidade, com seus desafios e limitações, começa a se impor, exigindo que o governo transcenda o encantamento inicial e se transforme em ação concreta.  

Em meus 20 anos de experiência na gestão pública – como prefeito por oito anos e secretário em diversas cidades por outros oito –, vivenciei essa transição repetidas vezes. Por mais idealizado que seja o início de um mandato, o encantamento inevitavelmente chega ao fim. Secretários, assessores e servidores que pareciam exemplares durante a campanha começam a mostrar limitações. O próprio prefeito, frequentemente visto como uma figura quase onipotente, descobre que seu poder e controle são mais limitados do que imaginava. Para alguns, essa desilusão é desanimadora; para outros, é uma oportunidade de ressignificar e reconstruir. A grande questão é: diante desse cenário, desistimos ou transformamos a desilusão em força para seguir adiante?  

O deslumbramento inicial precisa acabar. Governar é muito mais do que ocupar um cargo; é assumir a responsabilidade de dar respostas concretas aos anseios da sociedade. Não há espaço para ilusões prolongadas quando o que está em jogo são as necessidades reais da população. Nesse sentido, a liderança pública exige abandonar o brilho superficial do poder e focar na entrega de resultados, reconhecendo que o verdadeiro impacto de um governo está na capacidade de agir com eficácia e empatia diante dos desafios que surgem.    


Tancredo Neves em Brasília-DF / Foto: Daniel Quoist 


Tancredo Neves, um dos maiores líderes da história política brasileira, costumava repetir uma frase que carregava grande sabedoria: "A política é a arte do possível." Atribuída a Otto von Bismarck, essa expressão reflete a essência do governar. Para Tancredo, governar era transformar limitações em avanços concretos, com pragmatismo e sensibilidade. Ele compreendia que a política não é feita de sonhos inalcançáveis, mas da habilidade de encontrar soluções reais dentro das condições dadas. Essa visão, que unia idealismo e realidade, permanece uma inspiração para todos que acreditam na capacidade transformadora da liderança pública.  

Tony Blair, ex-Primeiro-Ministro do Reino Unido, trouxe uma reflexão que ilustra bem essa realidade. Em agosto de 2023, no Congresso do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), realizado em Belém do Pará, ele compartilhou uma experiência reveladora de sua trajetória. Blair contou que, no início de seu mandato, acreditava que sua assinatura em um documento seria suficiente para resolver problemas ou implementar políticas públicas. Com o tempo, porém, percebeu que isso nem sempre era verdade. “Things simply don’t happen, and it’s staggering” (as coisas simplesmente não acontecem, e é espantoso), afirmou ele, surpreso com a resistência da realidade diante de suas decisões. Se isso ocorre com um líder de uma das maiores potências globais, imagine o que não acontece com um prefeito de uma cidade no interior do Brasil, lidando com recursos escassos, burocracia e limitações estruturais.    


 Tony Blair no Pará — Foto: Reginaldo Gonçalves/TV Liberal


Esse momento de transição não é apenas sobre a desconstrução de idealizações. É também sobre amadurecimento – da equipe, do líder e do próprio conceito de gestão. Governar exige enfrentar limitações de todos os tipos: orçamentárias, burocráticas e humanas. Como bem apontou Max Weber, o exercício da liderança política demanda um “longo e obstinado trabalho” para transformar o possível em real. Essa perseverança é o que diferencia líderes que desistem ao primeiro sinal de dificuldade daqueles que conseguem inspirar suas equipes e transformar a adversidade em aprendizado.  

No entanto, esse período pode ser emocionalmente exaustivo. Muitos membros da equipe, especialmente aqueles na linha de frente, tendem a desanimar ao perceberem que o prefeito não é tão infalível quanto imaginavam, ou que as mudanças prometidas exigem um esforço gigantesco para serem concretizadas. Contudo, esse é o momento em que a fraqueza pode se transformar em fortaleza. Reconhecer que ninguém é perfeito – nem o prefeito, nem os secretários, nem os servidores – é o primeiro passo para construir uma relação mais autêntica, baseada no respeito mútuo e na confiança na capacidade de crescer juntos.  

Mais do que isso, é preciso unir esforços além da equipe interna. Como afirmou Hannah Arendt: "O poder é o que mantém a existência da esfera pública, o espaço potencial de aparência entre homens que agem e que falam. [...] O poder surge entre os homens quando eles agem juntos e desaparece no momento em que se dispersam" (Arendt, 1965, p. 200). A gestão pública só se fortalece verdadeiramente quando há uma conexão entre a classe política, a sociedade e os diversos atores que compõem a vida pública. O isolamento ou a fragmentação entre esses grupos enfraquece o mandato e compromete o objetivo maior de atender às demandas coletivas.  

A "lua de mel" característica dos primeiros meses de mandato é um marco inicial valioso, mas transitório. Sua efemeridade reforça o verdadeiro sentido da gestão pública: transcender o entusiasmo inicial para construir uma admiração sólida e duradoura. Quando o brilho superficial se dissipa, emerge o desafio de ressignificar o governo, substituindo o encantamento por um respeito fundamentado na ética, na resiliência e na disposição para enfrentar desafios coletivamente.  

Os primeiros dias de um mandato são um rito de passagem – um período em que ilusões dão lugar ao realismo, mas também à possibilidade de construir algo mais autêntico e duradouro. É nesse momento que o governo deixa de ser uma promessa e se transforma em ação. Apesar das limitações individuais, é no esforço conjunto que reside a força necessária para fazer a diferença.  

A lua de mel acaba. O encantamento passa. Mas é na ressignificação, no reencontro com o propósito e na valorização da humanidade que um governo encontra sua verdadeira grandeza. Afinal, a política não é a arte do impossível; é a arte de fazer entregas, mesmo enfrentando limitações - e, mesmo assim, construir, dia após dia, uma realidade mais digna e justa para todos.  


Referências  

ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1965.  

ARENDT, Hannah. Ich will verstehen. LUDZ, Ursula (Ed.). München: Piper, 1996.   

WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília: UnB, 1999.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Estratégia e Planejamento na Gestão Pública



Na gestão pública, os conceitos de estratégia e planejamento são frequentemente utilizados de maneira imprecisa, quase como sinônimos. Essa confusão terminológica pode gerar implicações práticas importantes, uma vez que a compreensão inadequada desses termos tende a limitar a eficácia das políticas públicas e a capacidade de adaptação do setor público às rápidas mudanças da sociedade. Estratégia e planejamento, embora complementares, possuem funções e abordagens distintas que, quando bem articuladas, podem transformar a administração pública em uma ferramenta poderosa de geração de valor social.

O planejamento é uma função essencial da administração pública, respaldada pela Constituição Federal de 1988, que organiza as políticas públicas em três instrumentos principais: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA). Esses instrumentos estruturam o ciclo orçamentário, articulando metas de longo, médio e curto prazos e garantindo a coerência entre as políticas públicas e os recursos disponíveis.


O PPA (que será elaborado pelas gestões municipais este ano), possui vigência de quatro anos, e estabelece diretrizes, objetivos e metas de governo, garantindo a continuidade administrativa mesmo diante de mudanças de gestão. A LDO detalha as metas anuais e serve como conexão entre o planejamento estratégico do PPA e as ações orçamentárias previstas na LOA, que, por sua vez, aloca recursos para a execução de programas e políticas públicas.


Além disso, há planos setoriais que complementam essa estrutura, como por exemplo o Plano Nacional de Educação (PNE), o Plano Nacional de Saúde (PNS), e seus correspondentes nos estados e municípios. Ademais, há os planos diretores municipais, regulamentados pelo Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001). Esses instrumentos orientam ações específicas em áreas como educação, saúde e urbanismo, alinhando políticas públicas aos objetivos maiores de desenvolvimento sustentável.


Estratégia: Flexibilidade e Adaptação


Enquanto o planejamento se concentra na organização de ações, a estratégia é um processo criativo e adaptativo que orienta decisões em cenários dinâmicos e imprevisíveis.


O professor canadense Henry Mintzberg (1994) enfatiza que a estratégia não pode ser reduzida a um plano formal. Para ele, a estratégia emerge de processos que combinam análise, experimentação e aprendizado contínuo. Essa abordagem é especialmente relevante na gestão pública, caracterizada por frequentes crises, mudanças políticas e demandas sociais nem sempre previsíveis .


A estratégia, nesse sentido, não busca controlar o futuro, mas preparar os governos para responder de forma ágil às mudanças. Durante a pandemia de COVID-19, por exemplo, os governos (nas três esferas federativas) precisaram redefinir prioridades estratégicas e alocar recursos emergenciais, demonstrando que, em cenários incertos, estratégias flexíveis são mais eficazes do que planos rígidos.


Planejamento Estratégico: Um Oximoro?


O termo "planejamento estratégico" é frequentemente descrito como um oximoro — a combinação de palavras que parecem contraditórias. Planejamento, por natureza, é estruturado, enquanto estratégia requer criatividade e flexibilidade. Essa contradição aparece em muitos contextos governamentais, nos quais o planejamento estratégico é tratado como um exercício burocrático, com etapas rígidas e metas engessadas, que acabam sufocando o pensamento estratégico holístico e genuíno.


De acordo com o professor brasileiro Jackson De Toni (2016), o planejamento estratégico no setor público deve ir além de um documento formal; ele precisa ser um processo contínuo e adaptativo, envolvendo análise crítica, participação social e avaliação periódica. Essa abordagem é essencial para alinhar metas de longo prazo às realidades mutáveis do presente.


O Plano Nacional de Educação: Colaboração e Estratégia


O Plano Nacional de Educação (PNE), instituído pela Lei nº 13.005/2014, é um exemplo emblemático de planejamento estratégico na gestão pública. Vigente para o decênio 2014-2024, o plano estabelece 10 diretrizes e 20 metas, como a universalização do ensino fundamental, a ampliação da educação infantil e a valorização dos profissionais da educação. Além disso, o PNE adota o regime de colaboração federativa, exigindo que União, Estados, Distrito Federal e Municípios trabalhem juntos para alcançar seus objetivos.


Essa abordagem colaborativa é fundamental para lidar com as desigualdades regionais no Brasil. Ao promover a cooperação entre os entes federativos, o PNE busca garantir maior equidade no acesso à educação e melhorar a qualidade do ensino em todo o território nacional.


O PNE também destaca a importância do monitoramento e da avaliação contínuos. Esses mecanismos permitem que os gestores públicos acompanhem o progresso das metas e ajustem estratégias com base nos resultados alcançados. Por exemplo, se uma meta de alfabetização infantil não estiver sendo atingida, é possível redirecionar recursos ou modificar abordagens pedagógicas. Essa lógica adaptativa ilustra como estratégia e planejamento podem se complementar.


O Plano Nacional de Logística e Seus Marcos Legais


Outro exemplo de planejamento estratégico é o Plano Nacional de Logística (PNL), regulamentado pela Lei nº 12.379/2011, que define as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. O PNL busca modernizar a infraestrutura logística brasileira, promovendo a integração entre rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Com um horizonte de planejamento de longo prazo, o plano utiliza ferramentas de análise estratégica para identificar gargalos logísticos e propor soluções que aumentem a competitividade do país.


Ao integrar diferentes modais de transporte, o PNL exemplifica como o planejamento estratégico pode alinhar políticas setoriais a objetivos nacionais, como o crescimento econômico sustentável e a redução de custos logísticos.


A importância da liderança estratégica


A liderança é o elemento central para transformar estratégias bem delineadas e planejamentos detalhados em resultados efetivos para a sociedade. Em um cenário público, liderar vai muito além de gerir recursos ou supervisionar equipes; trata-se de articular interesses diversos, inspirar coletivos e promover a mobilização de esforços em direção a objetivos compartilhados. Líderes públicos precisam compreender a complexidade de sua posição, equilibrando demandas imediatas com uma visão de longo prazo, como destacam Bovaird e Löffler (2021). Essa articulação é crucial para evitar que as metas institucionais se tornem apenas intenções desconectadas da realidade.


Além disso, a liderança no setor público demanda habilidades específicas para lidar com crises e incertezas, características frequentes no ambiente governamental. A capacidade de tomar decisões estratégicas em contextos de alta pressão, como observado durante a pandemia de COVID-19, reflete a importância de uma liderança que combina adaptabilidade e clareza de propósitos. Um líder estratégico não apenas responde às circunstâncias, mas também antecipa desafios e conduz equipes a inovar e a buscar soluções criativas para problemas complexos. Nesse sentido, a liderança pública deve ser ancorada em valores éticos e no compromisso com o interesse coletivo.


A liderança estratégica se concretiza por meio da construção de uma cultura organizacional alinhada aos objetivos públicos e sustentada pela colaboração. Promover uma cultura de transparência, participação e engajamento é essencial para que o planejamento e a estratégia se integrem à dinâmica cotidiana das organizações públicas. Líderes que conseguem construir pontes entre diferentes níveis hierárquicos e entre governo e sociedade civil tornam-se agentes de transformação, possibilitando que a gestão pública não apenas cumpra suas metas, mas também alcance resultados que realmente impactem a vida dos cidadãos.


Planejamento Estratégico: Presente e Futuro


Para fortalecer o impacto das políticas públicas, os governos precisam repensar sua abordagem ao planejamento estratégico. Em vez de tratá-lo como um exercício formal e isolado, é necessário integrá-lo ao dia a dia da administração pública, promovendo o pensamento estratégico em todos os níveis.

Isso exige uma mudança cultural, com foco na capacitação dos gestores, no uso de tecnologias modernas de análise e na promoção de uma cultura de participação e transparência. Além disso, é imprescindível adotar mecanismos de avaliação contínuos que permitam ajustar as estratégias conforme necessário, sem perder de vista os objetivos de longo prazo.


Integração e Transformação


Na gestão pública, estratégia e planejamento são conceitos distintos, mas complementares. O planejamento organiza ações e detalha "como" elas serão executadas, enquanto a estratégia orienta as prioridades e responde às perguntas "o quê" e "por quê". Quando usados de forma integrada, esses instrumentos ajudam governos a enfrentar desafios complexos e promover políticas públicas que gerem valor para a sociedade.


Repensar o papel da estratégia e do planejamento exige uma abordagem crítica. Não basta apenas cumprir metas ou seguir etapas predefinidas; é necessário criar políticas públicas que sejam capazes de se adaptar ao presente, antecipar desafios futuros e, acima de tudo, atender às reais necessidades da população.


Não é simples, mas é indispensável: estratégia e planejamento exigem visão, adaptação e compromisso com o futuro, pois somente assim a gestão pública poderá transformar desafios em oportunidades e entregar resultados que gerem valor para a sociedade.


Referências


  1. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br. Acesso em: 18 dez. 2024.

  2. BRASIL. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade. Disponível em: https://www.planalto.gov.br. Acesso em: 18 dez. 2024.

  3. BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Plano Nacional de Educação. Disponível em: https://www.planalto.gov.br. Acesso em: 18 dez. 2024.

  4. BRASIL. Lei nº 12.379, de 6 de janeiro de 2011. Política Nacional de Mobilidade Urbana. Disponível em: https://www.planalto.gov.br. Acesso em: 18 dez. 2024.

  5. BOVAIRD, Tony; LÖFFLER, Elke. Gestão Estratégica no Setor Público. Oxford: Routledge, 2021.

  6. DE TONI, Jackson. O Planejamento Estratégico Governamental: Reflexões Metodológicas e Implicações na Gestão Pública. Curitiba: Intersaberes, 2016.

  7. MINTZBERG, Henry. The Rise and Fall of Strategic Planning. New York: Free Press, 1994.